segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Bem Vindos a Ilha Comprida! (parte 2)

Continuação do relato de nossa saga na II Mostra de Curta-Metragem Fantástico de Ilha Comprida.

No dia seguinte fizemos nossa travessia diária de 5 km (a pé) em direção ao Plínio Marcos, desta vez mais certos da distância (eu disse que era realmente comprida) e ansiosos por novas exibições. Da primeira sessão, caracteristicamente mais leve por visar a presença de crianças, destaco Batateogonia, curiosa visão da origem da vida e o litorâneo Aranhas Tropicais, de André Francioli, humor apurado e inteligente sobre americanização. Neste dia compareceu Eutímio Carvalho, de A Lenda da Lagoa Vermelha. Duvidosos informantes dizem que Eutímio seria conhecido também como “o Zé do Caixão da Bahia”. Já peço desculpas prévias para o caso da comparação não ser fortuita (embora ser comparado ao Zé do Caixão seja mérito de relevância e o “da Bahia” ainda traga uma tonalidade apimentada ao apelido!) e também aproveito pra pedir sinceros perdões a respeito de risadas altas vindas do quarto ao lado (pois Eutímio ficou na mesma pousada longínqua que nós).

Nosso terceiro e último dia de visita a mostra (pois não pudemos comparecer a sessão do júri popular) foi marcada por produções que contaram com a participação de gente famosa. Do Mundo não se Leva Nada, que lembra uma produção da TV Cultura nos anos 90 e com a simpática Iara Jamra (do Rá-Tim-Bum!). Mas não pensem que eu vou cair num saudosismo anos 80! Sete Vidas, de Marcelo Spomberg e Zé Mucinho traz no elenco o gato Tutti Frutti, com a voz notável de Selton Mello, aquele cara que a gente encontra nas produções mais estranhas e nas situações mais inusitadas, como na pele de um escritor que, quando morre, torna-se um gato (assim como todos os escritores, o que me faz pensar sobre que escritora seria minha singela gata Lola). Outro curta interessante, mas que ficamos sem saber o final devido a problemas técnicos, foi O Esôfago da Mesopotâmia, de Isaac Chueke e Cristiana Grumbach, com figurinhas conhecidas da Globo (mas nem um pouco desmerecido por isso) e curiosa caracterização de diversos personagens num único ambiente.

Por fim, posso dizer que a mostra foi frutífera e tivemos a oportunidade de vender a edição mais recente do fanzine Fabulário para diversos espectadores. E mais: para a paulistana que leva chuva pra todo lugar que vai, fui até presenteada com um tempo ensolarado no sábado e no domingo. Deu até pra aproveitar um pouco a piscina da pousada (vou poupar os leitores das fotos mais intrigantes) e fazer a travessia pousada-mostra pela beira de praia! Foram, enfim, 7km de caminhada (e mais uns 500km de ônibus) que valeram a pena.

Agradecimentos: Edu Santana, Vivi Amaral e Oda Gomes que nos receberam muito bem em terras estrangeiras.

Colaborou para este post: Luiz Daniel, me obrigando a dividir o post em dois e servindo de bom fotógrafo do nosso experimento turístico.

CARA CAROLINA ,
é webdesigner e estudante
de Artes Plásticas pelo
Unicentro Belas Artes

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Resenha do livro “Renascimento – A Lenda do Judeu Errante”, de Sérgio Pereira Couto.

Antes de mais nada, quero pedir desculpas ao Sérgio pela demora em resenhar seu livro que li com muita atenção nas minhas viagens de ônibus da casa pro trabalho de do trabalho pra faculdade e da faculdade pra casa. Sérgio, pronto e gentil, nos enviou pelo correio (e por Sedex!) seu mais recente trabalho e cabe a esta humilde webmaster de e-comercce (daí já criando um vínculo pouco afetuoso com o personagem principal) agradecer pela atenção.

capa do livro Renascimento, a lenda do Judeu ErranteO judeu errante é um personagem milenar. Talvez por isso tenha servido de inspiração e referência para tantos autores em épocas diversas: Borges em seu conto “O Imortal”, Assimov no livro “Asimov´s Guide to the Bible”, na inacabada peça “O Judeu Errante”, do português José Régio. Os exemplos parecem ser infindos. Porém, o mais recente deles parece ser “Renascimento – A Lenda do Judeu Errante”, de Sérgio Pereira Couto.

Jornalista e escritor, Couto parece ter como uma de suas virtudes a queda pelo jornalismo investigativo, aquele em que o repórter vai direto as fontes para angariar informações. Em seus romances (Sociedades Secretas e Investigação Criminal), Couto parece não ter medido esforços para levar sólidas informações aos leitores, sem aqueles deslizes embaraçosos cometidos por quem fala sobre o que não conhece.

Neste último romance, Sérgio associa o espiritismo à lenda do judeu errante – aquele que foi amaldiçoado por Jesus a permanecer na terra até sua segunda vinda -, tendo como plano de fundo a renascença. Mas não pense que a trama ocorre num passado distante. Ao explorar a temática reencarnacionista, Couto faz uso de flash backs, retornos no tempo e viagem astral para contar a história de Roger, um empresário judeu tão contemporâneo poderia ser meu gerente que se vê preso a uma rocambolesca armadilha em que os espíritos, mesmo reencarnados, não se libertam dos assuntos pendentes.

Entrar em maiores detalhes seria boicotar a eficiência com que Couto amarra sua trama complexa, recheada de elementos que vão desde hieróglifos do Egito antigo até extremismo islâmico. Partirei, porém, para uma reflexão –talvez encabida - de âmbito maior. Couto parece saber bem pra quem escreve e em que tempos, posicionamento característico de um escritor maduro e profissional. “Renascimento” adota um ar de contemporaneidade incomoda. Esqueça as bibliotecas empoeiradas. Para obter valiosas informações os personagens vão a cybercafés e consultam o Google, além de contatar informantes pelo Messenger, isto tudo em contraposição aos vilões, que fazem uso das armas sobrenaturais para se comunicar. As referências que constam nas falas das irmãs Klinger são de seriados de TV e o maior passatempo das heroínas é fazer compras. A caracterização dada no início do livro sobre Elizabeth Klinger ser bibliotecária e gostar de assuntos acadêmicos enquanto sua irmã Emile é historiadora e professora substituta na USP acabam não refletindo bem nos hábitos das moças ao decorrer da história. Além de que às vezes é difícil lembrar que Liz é noiva de Roger, de tão independente que é a relação entre os dois. Seria uma características das uniões atuais, que pregam a efemeridade?

O que dizer então da pluralidade religiosa? Na mesma história estão bem delineadas tanto a doutrina espírita quando a católica, al´me do recalcado posicionamento judaico de Roger e a lembrança perene dos atentados de 11 de setembro em Nova Iorque e de 7 de julho, em Londres. Curioso notar que são os dois freis franciscanos os personagens de maior sincretismo de crenças, referência clara as dicotomias que a Igreja enfrente na atualidade.

Reforçando a crítica ao catolicismo (mais contemporânea, impossível), Couto coloca Savonarola, monge famoso por instituir as fogueiras da vaidade na Itália renascentista, como grande inimigo de Lourenço de Médice, governante de Florença e patrono das artes na renascença. Porém, não foi enfatizado o fato de que além de queimar Boticcelis, Savonarola combatia o luxo e a vaidade tanto da nobreza estadista como da própria Igreja, sustentando um posicionamento de desapego aos bens matérias. Numa história de contornos capitalistas, o monge só poderia ser dos mais malévolos, o tal “Rasputin” do mediterrâneo.

A visão pessimista da Igreja não é novidade no contexto literário ocidental. Quem não se lembra do bispo malfeitor Bispo Manuel Aringarosa e seu discípulo semi-humano Silas em “O Código da Vinci”, de Dan Brown? Couto, de fato, apresenta esta e outras semelhanças com o a obra do best seller norte-americano. Antes de se aventurar pelo romanesco, o autor publicou livros destinados a embasar a leitura der Brown e saciar a sede dos mais aficionados. Couto revisita o universo temático de Brown ao somar o comum ao pitoresco e faz uso de uma escrita fluida o bastante para acompanhar a velocidade da diegese narrativa. Porém, Couto vai mais longe ao incorporar o elemento sobrenatural.

“Renascimento” é daqueles livros que devem ser lidos de uma tacada só. Prender o leitor do começo ao fim, embora tantas transcrições da obra de Kardec – somada a boa memória dos personagens que citam longas passagens do Livro dos Espíritos – irrite um pouco. Como bom jornalista, Couto afirma em entrevista ao site Vampirus que respeita todas as crenças e mantém o distanciamento crítico. Mas acho que, tendo o livro como espelho, a situação é reversiva. Couto escreve como quem não acredita, mas com o coração de quem acredita (ou ao menos de quem se encantou com a literatura de Kardec e a visão confortante que ela traz, em contraposição a tradição de pecados e castigos que insistimos em carregar história à frente). Terá Kardec contabilizado mais um discípulo?

Colaboraram para esta famigerada resenha:
Tadeu Costa Andrade (semi-cristão e quase padre), alguns poucos motoristas menos barbeiros do 175P e muitos motoristas vagarosos do 557C e Dona Maru, minha avó, esta sim insaciável leitora de literatura espírita.

Referências:
Vampirus, Garganta da Serpente e Giz Editorial


CARA CAROLINA ,
é webdesigner e estudante
de Artes Plásticas pelo
Unicentro Belas Artes

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Bem Vindos a Ilha Comprida!



Embora eu goste das coisas em partes, mesmo porque costumo me estender demais nas explanações, este post foi idealizado por inteiro. Por questões referentes à rapidez da internet (não da sua internet discada, meu amigo, e sim a internet como mídia de ligeira contemplação) e pelo brilho cansativo dos monitores, dividi este relato em duas partes.

Tudo começou num feriado chuvosos. Chuvosos, pois, para bom paulistano azarado, não há feriado na praia sem um céu nublado e uma garoinha gelada. Mas este foi diferente, pois o objetivo maior da viagem não era pegar uma cor e sim presenciar um dos poucos eventos referenciais de cinema fantástico do país: a II Mostra de Curta-Metragem Fantástico de Ilha Comprida. Embora seja um evento de pequeno porte, a mostra é significativa. Nos 5 dias de duração foram apresentados diversos curtas, dos independentes de pequena verba aos que contam com maior apoio financeiro e de produção. As idéias são múltiplas: zumbis, vampiros, experimentos genéticos, sonhos e alucinações. Agora a pergunta que não quer calar: mas... Ilha Comprida?

Isso, mesmo. A mostra foi acolhida pelo Espaço Cultural Plínio Marcos e contou com o apoio da Prefeitura Municipal. O público é composto por pessoas de todas as idades advindos de regiões próximas e da própria ilha, além dos turistas e do pessoal que vem especialmente pra mostra. É fácil ver diversas crianças e adolescentes atentos na platéia, visto que a cidade é pequena (cerca de 9.000 habitantes) e não conta com shopping ou cinema, distrações habituais dos jovens das grandes metrópoles.

Mas o que nos impressionou mesmo, além do aspecto “paraíso perdido” de Ilha Comprida (realmente comprida!), foi a qualidade dos curtas exibidos, em especial a sessão da 19h do dia 15 de novembro, especial de horror. Joel Caetano, da Recurso Zero Produções e diretor do tragicômico Junho Sangrento, compareceu a sessão junto ao elenco que nos permitiu bater um papo sobre a produção independente e elogiar pessoalmente seu trabalho, que nos rendeu algumas piadas insólitas que repetimos até hoje. Joel disse que gostou dos curtas apresentados nas sessões anteriores, mas reclamou da não-linearidade dos roteiros. Eu, em contrapartida, acabei gostando dos curtas mais sem pé nem cabeça (também conhecidos como não-lineares) como Crisálidas, do mineiro Fernando Mendes e Akai, de Gustavo Arantes. Ambos trazem uma história embutida, mas é fato que a seqüência cronológica dos fatos não foi a preocupação maior de seus idealizadores.

Continua no próximo post, quando a paciência do caro leitor estiver renovada e seus olhos não estiverem lacrimejando mais.


CARA CAROLINA ,
é webdesigner e estudante
de Artes Plásticas pelo
Unicentro Belas Artes

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

A Bússola de Ouro na Fogueira

detalhe do cartaz
Olá, meus caros compatriotas!

Estava eu navegando pelo mar da internet quando me deparei com a seguinte manchete: "Novo filme de Nicole Kidman é acusado de promover o ateísmo entre crianças". Então fiquei muito curioso pra saber do que se tratava, era do filme A Bússola de Ouro que falavam. A comunidade cristã internacional está querendo fazer um boicote ao filme para que ninguém assista ou leia o livro, mas principalmente para que não filmem o resto da trilogia.
o link da notícia é esse: http://cinema.uol.com.br/ultnot/2007/11/28/ult1817u7369.jhtm
Gostaria de abrir uma discussão sobre o assunto ou apenas ouvir os comentários de vocês sobre o assunto!


RAFAEL CASTRO ,
cursa Filosofia no Mackenzie
e atualmente se dedica
a Iniciação Científica



P.S.: Levem todas as crianças que vocês conhecem para assistir o filme! hahaha

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Fanzine Somnium convoca escritores

O fanzine Somnium, do Clube de Leitores de Ficção Científica, vai lançar seu novo número (101), especial de fim de ano, e busca material de escritores (contos e artigos) que envolva Ficção Científica e Fantasia. O interesse, segundo os editores, é em contos inovadores e originais, dando preferência àqueles que têm no máximo 3000 caracteres. Os artigos poderão ter maior extensão.

O material deve ser enviado para o e-mail somnium@clfcbr.org até o dia 10 de Dezembro.

A imagem “http://ficcao.online.pt/jorge.candeias/somnium84.jpg” contém erros e não pode ser exibida.
Fanzine Somnium número 84, de janeiro de 2002

TADEU COSTA ANDRADE,
é estudante do curso de
Letras na FFLCH - USP

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Zé do Caixão no CCBB - Última Semana

José Mojica Marins, o Zé do Caixão

Essa é a última semana da mostra José Mojica Marins Retrospectiva – 50 Anos de Carreira no Centro Cultural Banco do Brasil, que vai até o dia 25 (domingo). Pelo jeito vale a pena conferir. Abaixo o texto de divulgação:

A mostra é a mais completa já realizada no Brasil e no exterior sobre a filmografia do grande José Mojica Marins. O evento tem ainda o compromisso de celebrar os 50 anos de carreira do cineasta, criador de um dos personagens mais populares da cultura nacional: o Zé do Caixão. Embora conhecido como precursor do cinema de horror no Brasil, Marins trabalhou no registro de diferentes gêneros – do melodrama ao fantástico, passando pelo bangue-bangue, pela ação, pela aventura e pela comédia. São exibidos durante a mostra longas, médias e curtas-metragens, em que Mojica atuou, dirigiu e produziu. A mostra exibe ainda um filme inédito, A Praga, finalizado especialmente para o evento. Recomendação etária: de acordo com o filme.

Confira a programação aqui.


TADEU COSTA ANDRADE,
é estudante do curso de
Letras na FFLCH - USP

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Futuro Mais-Que-Perfeito

É, neste final de semana estaremos em Ilha Comprida, com fanzines, cinema, sol e praia... ai ai.

Mas para quem vai ficar em São Paulo, capital, existe um consolo: o Itaú Cultural preparou, para este fim de semana prolongado, a Mostra Futuro Mais-Que-Perfeito. A mostra faz parte da exposição Futuro do Presente, que abriu esta semana.



O Itaú é de longe um dos espaços culturais mais dedicados às artes digitais e eletrônicas e ano passado sediou também debates sobre a Ficção-Científica no Brasil. A mostra está recheada de ótimos filmes de todos os tempos e feitos originalmente para todos os públicos, de Godard a Spillberg. A qualidade é tanta que fica difícil indicarmos uma seção em especial: todos os que conhecemos são pérolas, e os que ainda não vimos parecem não dever a eles em nada.

Vale MUITO a pena e nós do Fabulário lamentamos muitíssimo pela concomitânia... esperamos que, algum dia, o Itaú repita a dose.

MOSTRA ITAÚ - FUTURO MAIS-QUE-PERFEITO
Programação

quinta 15 novembro
15h00 O Homem do Sputnik
17h30 Brazil, o Filme
20h30 London Brief

sexta 16 novembro
15h00 Onde a Terra Acaba e O Homem do Morcego
17h30 Alphaville
20h30 Natureza Morta e Operários ao Sair da Fábrica

sábado 17 novembro
15h00 Uma Aventura aos 40
17h30 Natureza Quase Humana
20h30 Enredando as Pessoas

domingo 18 novembro
15h00 Os Cosmonautas
17h30 Minority Report - a Nova Lei
20h30 Retrospectiva Wagner Morales

terça 20 novembro
15h00 2046 - os Segredos do Amor
17h30 Stalker
20h30 Love is a Treasure


O itaú cultural está localizado na avenida paulista 149 são paulo sp, próximo ao Metrô Brigadeiro.

Mais informações sobre a exposição e uma pequena sinopse dos filmes podem ser encontrados (com alguma boa vontade, é verdade) no site http://www.itaucultural.org.br/



LUIZ PIRES,
é webdesigner e estudante
de Artes Plásticas no
Unicentro Belas Artes

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Lançamento Oficial: Fabulário #1
na II mostra de Curtas de Ilha Comprida!!!

Está confirmado!
Dia 15 de novembro, feriado da República, será lançada a edição número 1 do Fanzine Fabulário. Serão 20 páginas de conteúdo diverso, entre artigos, resenhas, contos, quadrinhos, releituras...

E não pára por aí! O palco do lançamento será nada mais nada menos que a II Mostra de Curta-Metragem Fantástico de Ilha Comprida. Apelidamos por aqui de Mostra de Curtas de Ilha Comprida (que é mais fácil de falar).

Então: o Lançamento será na quinta-feira e venderemos o Fanzine também nos próximos dois dias de Evento. Serão cinco fanzineros (pessoas corajosas que deixarão São Paulo e atravessarão uma auto-estrada em pleno feriado prolongado) a disposição de compradores e interessados!

O Fanzine será vendido pela módica quantia de 1 real.


LUIZ PIRES,
é webdesigner e estudante
de Artes Plásticas no
Unicentro Belas Artes

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Calor
material excedente da Edição Beta


Faltavam apenas 5 minutos para o fim do expediente, mas não pareciam 5, pareciam 500, 500.000. Cada segundo era uma dor tão palpável quanto a dor obturação.
Calma Cláudio... - disse para si mesmo – Você já vai embora... Se não fosse essa merda de calor...

Ele tentava se concentrar em outras coisas, mas a única coisa que chamava sua atenção era a movimentada rua que vislumbrava através da única vidraça visível de seu cubículo, embaçada pela mesma fuligem que fustigava seus poros. Cláudio sabia que lá o calor seria o mesmo e ainda haveria os esbarrões, a claustrofobia e todo o desconforto típico das multidões. Mas lá fora parecia se iniciar um belo poente, daqueles que surgem como uma torrente, uma ducha, que lavam a febre caótica das tardes de inverno pós efeito-estufa. Tudo e todos na rua pareciam sentir isso e espreguiçavam-se, quase como se estivessem voltando à vida. O único lugar que se mantinha indiferente a isso era o escritório que perpetuava o mesmo calor sufocante das 2 da tarde.

Ainda assim, Cláudio permanecia digitando um documento qualquer que ele nem sabia do que se tratava, apenas para tentar abstrair o calor – 3 minutos ainda – grunhiu, olhando o velho relógio de bolso e jogando-o sobre a mesa com raiva. Suas mãos agora não estavam apenas escorregadias, mas também pareciam engorduradas como se estivessem untadas em banha de porco.

Tentando ignorar isso, Cláudio passou a digitar rápido e com raiva, muita raiva. Ele pensava no calor, no chefe ignorante e no tempo que ele perdia dentro daquele antro de puxa-saquismo e competição desleal, realizando serviços que na maioria das vezes só prejudicavam as pessoas normais em prol dos lucros de meia dúzia de figurões semi-etéreos que ele nunca viria a conhecer e se conhecesse, não demonstrariam uma gota de gratidão pelo naco diário de alma que ele depositava em seus cofres.

“Ótimo, tá acabando o martírio”, suspirou Cláudio ao perceber que só faltava um minuto para poder ir embora e decidiu relaxar um pouco. Se espreguiçou, esticou os braços, olhou para o teclado de relance e achou que tinha derrubado algo nele. Que merda de gosma alaranjado é esse em cima do teclado? E esses pedacinhos vermelhos no meio? Quando puxou sua mão de traz da nuca para ver que raios era aquilo, percebeu que aquele liquido pegajoso escorrendo do seu corpo e que agora se espalhava pelo teclado e pela mesa era mais que suor. Horrorizado, teve a confirmação do impossível ao ver um dedo desprender-se de uma mão tão decomposta que não reconhecia como sua.

Em pânico, Cláudio olhou ao redor e percebeu não era só ele; tudo ao seu redor começava a derreter e desmoronar. Mesa, cadeira, paredes do cubículo, tudo estava caindo, sumindo, obliterando-se. Tudo rápido, rápido demais pra pensar em salvação ou em porquês. O computador desligou, assim que começou a esvair-se e ele pode visualizar no reflexo o branco de seu maxilar despregando-se da face. Tentou olhar pela janela em busca de alento e sua única resposta foi um céu tingido de zilhões de tons de vermelho pelo entardecer. Em meio a estrondos abafados e o chapinhar do que ainda era sólido caindo no que já havia derretido, Cláudio viu seu relógio, estranhamente intacto, absurdamente alheio a hecatombe, e num último esforço conseguiu alcançá-lo com o que um dia foi sua mão e proferiu em um misto de insanidade e alivio:

Acabou...




REBUCCI DE MELO ,
trabalha como operador de telemarketing,
cursou Geografia no CEFET-SP e, com sorte,
será estudante de Ciencias Sociais na USP no próximo ano.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Material Excedente

Legalzinho. É assim que um bando de pessoas me classificaram, nada mais nada menos. Após o disparate de ser transmutado para um computador e ser impresso em uma folha de rascunho eles tem a coragem de me chamar de legalzinho. Ora sem inhos e eufemismos para meu lado. Fui posto de lado, material que não merece sair na publicação, fico numa pilha com outros renegados também impressos em rascunhos.

Eu sei bem como é difícil uma vida de texto renegado, ou como eles dizem material excedente, aquilo que não presta agora e se um dia prestar eles publicam, o problema meu amigo é que esse dia nunca chega. Tenho experiência nesse negócio de texto impresso, não é primeira vez que venho parar numa folha. Da primeira vez conheci uma carta, papel timbrado, caligrafia perfeita e um perfume que só ela tinha. Nos separamos por motivos de força maior, ela foi pra Europa, já eu fiquei na cidade.

Já conheci muitos tipinhos, mas o pior tipo de texto que você pode encontrar são os científicos, eles enchem o saco com aquela erudição e ficam se gabando das suas notas de rodapé. "Olhe como minha nota de rodapé é enorme e bem trabalhada". Sério, esses fazem minha tinta escorres de raiva. Bem diferente dos científicos são as publicações de variedades, essas são um barato porque você nunca sabe o que vai encontrar, se bem que as vezes eles são um tormento pois fazem questão de mostrar como são descolados e informativos.

Para textos impressos eu estava bem preparado, agora ao entrar na internet, a coisa ficou diferente. Essa porra é um caos sem limites, aqui não convivem só textos ou imagens, que era o que eu estava habituado a conviver, nesse universo surreal sou obrigado a disputar espaço com uma infinidade de coisas, são filmes, vírus, jogos, sites inteiros. Sinceramente não sei como um bom texto pode sobreviver aqui, como me disse um manuscrito do século XVIII: "Já nã se escreve mais como antigamente."



RODRIGO CANALLE ,
Gênio, futuro historiador,
metido a filósofo, descolado,
divertido e atualmente, mentiroso.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

A Casa-Açúcar
material excedente da Edição Beta

Poucos sabem, mas houve redução de conteúdo para a Edição Beta. Originalmente ela deveria ter mais páginas, mais diversidade também. Para incentivar a produção dos membros, decidimos que a edição n° 1 não deveria receber nenhum material elaborado para a anterior. Estaremos colocando esse excedente no Blog a partir e hoje.

Em uma noite fria e sem estrelas Lou teve o pior sonho de sua vida, um grande monstruoso rato a atacou em sua casa e tentou lhe devorar. No sonho ela correu por toda a casa, que já não era a mesma, suas paredes e objetos eram estranhamente rabiscados e vivos.
Ela acordou com um pulo e saiu em disparada para o quarto de sua avó...

Mas sua casa já não era a mesma. As paredes agora eram de açúcar e os móveis de todos os tipos de doce possíveis. Sua avó já não estava mais lá, no seu quarto havia apenas um gigantesco rato, só que dessa vez ele não a assustava, era fofo, rosa e dormia suavemente...

JOJO,
ex-aluna da USP, cursa
Design Gráfico na
ETE Carlos de Campos

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

II Mostra de Curtas Fantásticos de Ilha Comprida

Encerram agora no final de setembro as inscrições de vídeos para a 2° Mostra de Curtas Fantásticos de Ilha comprida!


O evento, realizado pela FlyCow produções e pela Prefeitura de Ilha Comprida, abre no dia 14 de novembro e encerra no sábado dia 18, aproveitando o feriado prolongado.

Ilha Comprida fica no litoral sul de São Paulo. Chegar até lá para alguns pode parecer desanimador a princípio, mas pelo jeito vai valer o esforço.

O objetivo da mostra é trazer à tona a produção de novos diretores e estudantes, além de potencializar as discussões na área e motivar novos projetos. Na primeira edição do evento, no ano passado, a mostra contou com curta-metragens excelentes (como Historietas Assombradas para crianças malcriadas) e os premiados lá foram exibidos também no 2° FANTASPOA (veja mais abaixo).

De cara, (feliz ou infelizmente) isso já torna a mostra uma das mais importantes do gênero no Brasil.

Quem tiver interesse em embarcar nesta jornada pode descobrir algumas rotas através do site Guia da Ilha Comprida.

site do evento:
http://www.mostracurtafantastico.com.br/

como chegar:
http://www.guiadailhacomprida.com.br/ilha/como_chegar.asp


CONHEÇA TAMBÉM O FANTASPOA,
28 SET - 07 OUT

Festival de cinema fantástico de Porto Alegre

FANTASPOA - Site Oficial da 3° Ed (ótimo)
Programação - Santander Cultural

Como é bom ver cinema fantástico (pra valer), cobertura (2° ed) de Eduardo EGS no site Overmundo (excelente)



LUIZ PIRES,
é webdesigner e estudante
de Artes Plásticas no
Unicentro Belas Artes



a II Mostra de Curta-Metragem Fantástico de Ilha Comprida foi uma indicação do colaborador L R Fernandes à nossa lista de discussão

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Processo Criativo e Observação


Pode-se igualmente compará-lo a um espelho tão imenso quanto essa multidão; a um caleidoscópio dotado de consciência, que, a cada um de seus movimentos, representa a vida múltipla e o encanto cambiante de todos os elementos da vida.


- Charles Baudelaire, “O Pintor da Vida Modena”



Talvez alguém se pergunte porque um tema tão geral para uma primeira postagem de um grupo que diz que tem como foco o fantástico. Talvez essa mesma pessoa ache tudo isso irrelevante e... tenha razão. Por que, mesmo sabendo disso, estou escrevendo esse texto? Tenho visto esse tema incomodar a muitas pessoas há tempo: o problema da criatividade, da inspiração. Quando olhamos o escritor do fantástico, também é de se esperar que ele seja muito perturbado por isso (se não for mais do que os outros), uma vez que sempre lhe é cobrado o novo, o encantador. Se eu quero dar uma solução? Por ora não me sinto capaz. O que gostaria de fazer é agrupar algumas considerações que fiz sobre o assunto e, no mínimo, expô-las para alguns amigos, que só as ouviram de forma esparsa.

Se a inspiração é um acontecimento de natureza misteriosa e repentina que oferece uma idéia para a criação de uma obra de arte, eu não acredito nela, pelo menos não muito. Se eu dependesse dessa inspiração, raramente teria escrito uma linha. Acabei encontrando refúgio em outro procedimento que também acabei nomeando, carinhosamente, inspiração. Mais do que iluminação, ele tem muito mais a ver com observação e, por mais que isso pareça contraditório à criação, realidade.


Pelo menos nós que vivemos na grande cidade, às vezes não nos damos conta do número de coisas que acontece à nossa volta: o incontável número de pessoas que vemos, as diversas frases que ouvimos, os inumeráveis eventos que presenciamos e mesmo a quantidade de coisas levemente inexplicáveis que ignoramos. São tantos rostos, roupas... Nós paramos para pensar o que eles significam? Os carros vêm e vão, nunca param. Para onde será que vão todos eles? As duas coisas poderiam dar ótimas histórias. Uma vez vi um acontecimento bastante estranho: eu estava no metrô com um amigo e, de repente, o condutor disse que alguém havia morrido por ter caído na via. Nunca tinha ouvido isso falado de forma tão direta, fiquei espantado, no entanto, quando olhei em volta, o que mais me admirou foi a indiferença na expressão dos passageiros e ainda mais, a frase de despreocupação do meu amigo quando comentei o fato. Independentemente do que pode ser uma “lição de moral”, tanto o acontecimento quanto a reação das pessoas me deram um conto inteiro.


É uma posição parecida com a de um poeta de que gosto muito, Baudelaire.1 Falando de um artista que admirava, ele louvou sua capacidade de, como uma criança, “se interessar intensamente pelas coisas, mesmo por aquelas que aparentemente se mostram as mais triviais”, identificando esse poder com o gênio ( que para ele é como uma infância redescoberta)2. A diferença entre o artista e a criança seria que o primeiro tem suas habilidades desenvolvidas, podendo transformar suas impressões em arte.


Mas alguém poderia dizer: “Observar a realidade: essa não é uma atitude que leva o realismo? Ela não é oposta à fantasia?”. Talvez para responder, eu posso recorrer a Baudelaire novamente: segundo ele, a imaginação ( curiosamente phantasie, em francês) “decompõe toda a criação, e, com os materiais acumulados e dispostos conforme regras das quais não podemos encontrar origem senão no mais profundo da alma, ela cria um mundo novo, produz a sensação do novo”3. Não vemos muitas vezes na fantasia elementos da realidade desconstruídos e recombinados? Não é o minotauro uma mistura de homem e touro? A esfinge de leão, mulher e águia? Tomar a realidade como ponto de partida não significa imitá-la servilmente. É mais como uma coleta de ingredientes que, juntos, cuidadosamente dosados pelo feiticeiro, formam uma poção.


Essas são mais ou menos as idéias que eu queria expor, que, apesar de estarem muito longe de uma visão definitiva sobre a criatividade, me ajudaram a atingir um pouco dela. Espero que possam servir a mais alguém.

A imagem “http://strictement-confidentiel.com/images/photos/baudelaire.jpg” contém erros e não pode ser exibida.

Baudelaire




TADEU COSTA ANDRADE,
é estudante do curso de
Letras na FFLCH - USP




1Poeta francês do século XIX considerado o fundador da poesia moderna e, também, pai do simbolismo. (artigo na Wikipedia : http://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Baudelaire . Artigo mis vasto, em espanhol: http://es.wikipedia.org/wiki/Charles_Baudelaire)

2 O texto em questão é “O pintor da vida moderna”, sendo o artista Constantin Guys. O fato de Baudelaire falar de um pintor e não de um escritor não é um problema, uma vez que ele constantemente aproxima as duas artes.
3A afirmação está no texto “Salão de 1859”.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Fabulário Blog

Fábula veio do latim "fabula", que significa história, não no sentido do estudo do passado mas sim de conto, de narrativa. Com o tempo, a palavra passou a estar mais associada às histórias de fundo moral que envolviam animais e objetos inanimados, no entanto, este não foi o único significado reconhecido. Diversas palavras que derivaram de "fábula" mostram os mais diversos significados: "fabular", contar; "confabular", mentir, "personagem fabuloso", personagem ficcional, "fabuloso", incrível, maravilhoso. A ligação maior entre as muitas faces desta palavra é a relação com o "imaginário", com o "incrível".

E o que é um fabulário senão uma coleção destas histórias, destes contos, destas narrativas fantásticas que perambulam pelo imaginário dos povos? O que é senão uma fonte de mundos e situações possíveis e impossíveis onde os homens buscam sua diversão (e mesmo sua sabedoria)?

E hoje? Morreram as histórias? Tudo já foi contado, imaginado, mentido? Ou nosso mundo é moderno demais para essas coisas? Nós achamos que não. Existem por aí contos os mais diversos, esperando para ser contados, escutados e... imaginados. Achamos, e esperamos estar certos. Se sim, alguns deles te aguardam nas páginas deste Fabulário.

Escritores, produtores e organizadores do Fanzine Fabulário